Antologia de textos com cães dentro.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

os mercadores de unguentos atravessam as paredes
pergunto em que acredito que memórias salvamos
arrombam as moradas esgrimem a blandícia
ameaçam com o inferno excluem-me estrangeiro
às vezes dou por nós submersos como um rio
devorado por suas próprias margens quem me
interdita o mundo? ignoro a porta e desço
sobre um lasso piano um lençol todo branco
e a música que resta sou eu como um navio
apontando ao destino o mistério da proa
ou lançando as suas luzes pálidas sobre
a pólvora dos astros que o oceano duplica
por aqui o camarote é individual um banco
um beliche um espelho um íntimo cardume
e a poalha das verrugas caligráficas que
vou ferindo na doce criptoméria oh dúctil
e mais que as outras benévola matéria
e vendo como se apressa digo como se atrasa
o rastilho do tempo rasgado a fogo e osso;
que onde amor gradeava a palavra
de enxames inocentes
ruge agora a mandíbula que ladra
com imensos dentes
cão até setembro
tenta escrever e não podes saber como se pode
contra o postigo o que digo
o osso exposto tão montanhoso tão
latido e entalado alimento de cão


28-6-89


José Sebag
Cão até Setembro
Instituto Açoriano de Cultura e Câmara Municipal da Horta, 1991


Oferecido por Rui Almeida.

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