Antologia de textos com cães dentro.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Eis a casa nova a prisão
disfarçada de refúgio aqui
te prendem os fios tecidos por ti
agora não podes fugir
cão solitário sem destino não é possível
devolver-te à procedência
és uma carta sem paradeiro certo
estás morto ou és endereço errado
é neste lar prisão que deves ficar
é aqui o teu último destino certo
pelo menos ninguém aqui virá
reclamar-te por teres certo valor
não tens nem o sonho de o vir a ter
a ração é feita de sons e de sonhos
de cão a enxerga de palha molhada
quando vier calor seca-te ao sol
é assim mesmo a vida de cão
solitário talvez e sem dono ou voz
de comando longínquo e cego
talvez só daqui a alguns anos
a bengala não é para te açoitar
dá o som e a cadência certa
ao cão sem dono e sem destino
irremediavelmente prisioneiro
de uma coleira com trela deslizante.

Carlos Alberto Machado
A Realidade Inclinada
Averno, 2003

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